quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Fidelidade e constância de Santa Rita

O que mais deseja Santa Rita de Cássia de seus devotos é a total fidelidade a Deus e irrestrita perseverança no aperfeiçoamento espiritual. 

Ela deixou o exemplo, pois para ela o Ser Supremo era tudo, seu fim único e necessário. Este modo de pensar e de ser influenciava toda sua conduta interior e exterior. Dado que Jesus veio ao mundo para ser o caminho seguro para o Pai, manifestando o imenso amor divino na sua Paixão e Morte, o Crucifixo era sempre, realmente, o ponto de mira desta santa extraordinária.

 Ela passou a ter Cristo fixo na sua mente, no seu coração. Estava então inteiramente mergulhada no oceano de dileção imensa deste Deus que era tudo nela e ela tudo nele. Ela reconhecia sinceramente ser nada diante de seu Senhor. 

Testemunhava o seu amor a Ele através da aceitação das mais terríveis provações nas diversas etapas de sua vida como esposa, mãe, viúva e, depois, como religiosa agostiniana dentro de um convento. Ela sabia que não era capaz de glorificar a Deus por si mesma. Assim sendo, Lhe entregava todo seu ser, todas as suas potências, todas as suas ações. Submetia-se em tudo aos desígnios da Providência, acatando inteiramente o domínio soberano do Criador. Por contemplar continuamente em Jesus na Cruz seu benfeitor por excelência, quis se identificar com Ele e repetia com São Paulo: “Eu só quero conhecer Cristo e Cristo crucificado” (1 Cor 2,2). Eis por que, inclusive, mereceu ter na fronte um espinho da coroa de Jesus. Este era sua felicidade, seu fim último. Como, porém, a liberdade humana deve ser ininterruptamente ajudada pela graça, Santa Rita vivia numa oração contínua. Movida pela ação divina todo o segredo de sua santidade estava numa fidelidade ininterrupta e numa constância que nada a fazia fugir de uma vida sobrenatural intensa.

 Esta se refletia numa dependência radical à vontade de Deus. As graças que recebia do Alto ela atribuía unicamente à pura bondade de Jesus, o Reparador da natureza humana decaída por causa da desobediência de Adão e Eva. Quanto mais, porém, Santa Rita penetrava no mistério da Cruz, mas ela desejava padecer para reparar os desatinos daqueles que erram nos caminhos dos vícios. Ao corresponder inteiramente às luzes divinas ela se tornou uma das mais admiráveis e admiradas santas. Então ao deixar esta terra se fez poderosa intercessora junto ao trono da Santíssima Trindade.  

Ela jamais contristou o Espírito Santo, uma vez que nunca deixou de fazer tudo que Ele a inspirava, elevando-a, deste modo, aos páramos da santidade mais eminente. É claro que os que a veneram não chegarão às alturas desta perfeição que esplende na existência de sua Patrona. Contudo, ela almeja que, na medida do possível, apesar da fragilidade humana de cada um, que Deus seja para seu devoto tudo, quer na ordem da natureza, quer na ordem da graça.  Ao suportar com paciência os sofrimentos inevitáveis desta trajetória terrena seu devoto pode e deve ser um reflexo da grandeza espiritual desta santa. Ela estará sempre a seu lado para que ele não desfaleça na caminhada rumo à eternidade. 

 Ajudará a vencer o amor próprio e todo obstáculo à submissão integral ao império de Deus. O devoto de Santa Rita sabe afastar o estoicismo, bem com todo dolorismo mórbido, mas, quando a cruz se torna pesada, ele a aceita generosamente, resignadamente com Jesus, em reparação das próprias faltas e dos pecados que se cometem mundo todo. Como Santa Rita, adere ao Mestre divino crucificado. Sabe perfeitamente que “sofrer passa, ter sofrido permanece eternamente”! Graças à proteção de Santa Rita proclama que é “feliz aquele que sofre e sabe para que sofre”, dando uma aplicação transcendental aos aborrecimentos deste exílio terreno. Santa Rita está a ensinar que “há permutas de amor com Deus que sós se fazem sobre a cruz”. 

Para quem tem fé o sofrimento leva, de fato, a uma profunda união com Cristo. Por outro lado, Santa Rita faz compreender assim. que nada purifica tanto o cristão como a aceitação humilde das provações que Deus envia. É que, enquanto dura a dor física ou moral. o fiel é chamado a exercer um papel propiciatório do mais alto valor para o sistema eclesial. Com a proteção de Santa Rita tudo supera e é sempre fiel e perseverante.

A vocação do Cristão

No Antigo Testamento ficou registrado o que Deus preceituou: “Sede santos, porque eu sou santo” (Le 11,44;19,2). Surge então a questão: “Qual é a essência da santidade divina”? A resposta foi dada por Cristo.  A essência da santidade divina é a perfeição. Com efeito, Jesus ordenou: “ Sede perfeitos como o Pai celeste é perfeito”.(Mt 5,48).  Como, segundo São João, “Deus é amor” (1 Jo 4,8), para atingir a perfeição é preciso amar.

 Resultam então os mandamentos, consequência do amor eterno que reina na Santíssima Trindade. Este amor deve ser vivido pelo seres racionais, levando-os à santidade. Cristo ensinou: “Ama o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu entendimento. Este é o primeiro e o maior mandamento. O segundo é semelhante a este: Ama o teu próximo como a ti mesmo” (Mt 22, 36-40). Eis  o caminho traçado para o cristão,  chamado à santidade. Santo é, então, aquele  que acolhendo a graça de Cristo e seguindo docilmente a ação do Espírito divino, se deixa envolver pelo amor que flui do Pai. 

É Aquele que,  no âmbito  de suas limitadas, porém, irrepetíveis qualidades pessoais corresponde com total dileção às inspirações divinas seja qual for o seu estado de vida. Foi o que lembrou o Concílio Vaticano II: “Nos diversos gêneros de vida e nas diversas profissões, há uma  só santidade, cultivada pelos que são movidos pelo Espírito de Deus e, obedientes, à voz do Pai e adorando em espírito e verdade a Deus Pai, seguem a Cristo pobre, humilde e sobrecarregado com a cruz para poder merecer a sua glória. Cada um segundo seus próprios dons e graças, deve progredir sem demora pelo caminho da fé viva, que acende a esperança e age por meio da caridade (LG 41). O cristão, porém,  precisa estar consciente de que ele não é  simplesmente um ser racional, pois pelo batismo se torno em Cristo participante da natureza divina (2 Pd 1,8). Ora, “Santo, santo, santo é o Deus todo poderoso” (Ap 4,8). 

Portanto,  trata-se de um esforço por uma purificação cada vez maior, destruindo em si  tudo que se opõe à santidade divina, adquirindo, na pratica do amor, todas as virtudes que o tornam agradável a Deus. O caminho foi traçado por Jesus a cujas máximas se adapta seu seguidor. Ele é o modelo, o princípio e a causa eficiente da perfeição dos que Lhe pertencem.  A Ele o cristão consagra todo o seu ser e se deixa conduzir pela suas luzes.  É óbvio que deste modo  este autêntico cristão não só afasta todos os obstáculos para poder viver unido a Cristo, mas cumpre, num esforço contínuo, todos os seus deveres em casa, no trabalho, seja onde estiver. Tudo feito por amor a Deus e ao próximo em qualquer circunstância.  Este fiel goza a verdadeira liberdade, jamais se escravizando às paixões, aos vícios, aos desregramentos éticos. É assim que  milhões de batizados , em suas situações existenciais concretas, participam   e compartilham de forma profundamente pessoal da vida e do amor de Cristo.  Estes difundem  em torno de si o calor do amor divino. 

 O esplendor de suas vidas é luz que refulge diante de todos que então passam a glorificar o Pai que está nos céus. Entende-se, desta maneira, a veracidade do brocardo: “Se és cristão, tens o mundo nas mãos”. Aí está a dimensão eclesial da santidade. É a força do testemunho de vida que arrasta os outros para a vivência do Evangelho. Tudo isto flui da consciência que se tenha da necessidade do intercâmbio de bens com os outros. Deste modo, o amor mútuo se converte em lei operante na realização da transformação de tudo e de todos em Cristo. Assim, cada um vai se enriquecendo espiritualmente no contato com os outros membros da comunidade  que é a Igreja, o Corpo místico de Cristo. É uma intercomunicabilidade  que engrandece, como bem se expressou Elisabeth Leseur: “Uma alma que se eleva, eleva o mundo inteiro”

Esta realidade dá ânimo a cada um para se aperfeiçoar cada vez mais a fim de  beneficiar não só o meio em que vive, mas a todo o corpo eclesial. Amor operante  que sustenta a santidade de todos  os cristãos espalhados pelo mundo inteiro unidos na glorificação contínua do Pai, pelo Filho sob os influxos santificadores do Espírito Santo.

Preciosos ensinamentos de Jesus

No contexto atual o trecho do Evangelho de São Marcos, que oferece preciosos ensinamentos do Mestre divino, pode ser melhor ainda compreendido (Mc 9,38-48). Igualmente o que se lê no Livro dos Números  (Nm 11,25-29). 

Com efeito, com o crescimento populacional não apenas nas Metrópoles, mas nas cidades em geral, numerosas são as Paróquias e nelas surgem diversas comunidades com suas particularidades. A grande mensagem é então que nunca se deve invejar o bem espiritual dos irmãos na fé, mas se rejubilar com isto fazendo crescer o Reino de Deus. Há, é certo, diretrizes pastorais, arquidiocesanas e paroquiais. 

Que devem ser sempre observadas, mas as comunidades têm características próprias advindas de diversos fatores sociais e também das lideranças corretas que vão surgindo. Não se pode impedir que o Espírito Santo atue onde e como Ele quer. O Bispo ou o Pároco têm o discernimento suficiente, a graça específica que lhes é concedida do Alto, para verificar se é, de fato, ação de Deus ou do Espírito das trevas o que se passa nestas comunidades. No tempo de Moisés surgiu o caso de Eldad e Médad.  João foi reclamar com Jesus a atuação de alguns que agiam em nome do Mestre divino e não era seguidor deste Apóstolo. 

A resposta de Cristo mostrou que ninguém tem o monopólio dos dons divinos e afirmou: “Quem não é contra nós é por nós”. Magnífico apostolado operam aqueles que rezam e os Grupos de Oração, por exemplo, atraem graças admiráveis para conversão dos pecadores, para consolação dos tristes, dos desanimados. Curas são obtidas pela fé com que preces são feitas pelos doentes. 

O Arcebispo de Mariana Dom Oscar de Oliveira, ao voltar de suas fatigosas Visitas Pastorais, costumava dizer que Ele ficava encantado com almas simples, que nunca tinham estudado teologia, mas que falavam maravilhas sobre Deus e a religião em geral. Em todas as comunidades há fiéis generosos em acolher, partilhar e catequizar. Nunca se deve esquecer que todo  ato de bondade, mesmo o mais simples, abre a porta do céu e atrai bênçãos para toda a terra. O grande desejo de Deus é que todos estejam unidos, solidários uns com os outros sem qualquer laivo de invídia. 

Condenável seria se aparecessem aqueles que não obedecessem às orientações da Igreja ou que quisessem dominar os irmãos na fé, impondo seu modo de ver e de ser, o que, por vezes, pode ocorrer. Além de tudo isto, Jesus mostra para todos os seus seguidores o caminho da conversão. Condena todo e qualquer escândalo, sobretudo os maus exemplos que tanto mal espiritual podem causar ás crianças. Acrescentou uma norma de conduta para os que lhe são fiéis: cortar e arrancar. Não se trata de mutilação física, mas ética. Condena então as mãos do avarento que quer tudo para si e nada paras os outros como bem explicou a carta de São Tiago (Tg 5,1-6). 

Os pés jamais devem conduzir um fiel para os caminhos do pecado, eles representam a liberdade humana, mas esta não pode ser confundida com a libertinagem. Andar, isto sim, nos caminhos de Jesus. Ninguém deve arrancar os olhos, mas pode, muito bem, desligar a televisão, a internet, diante de programas depravados e evitar olhares pecaminosos atinentes ao sexto e ao nono mandamentos. Eva ficou olhando o fruto proibido do Paraíso e desgraçou toda a humanidade. Foi o olhar impudico de Davi  ao contemplar  Bethsabé que o tornou assassino e adúltero.

 As seduções mais perniciosas veem exatamente dos olhares incautos. Estes suscitam os mais perniciosos desejos e levam à pratica dos maiores desvarios. Enfim, o que Jesus está a ensinar é a supressão corajosa, destemida, perseverante de toda ocasião de pecado. Fuga de tudo que pode afastar alguém de seu Senhor. e levar  para a geena onde o fogo não se extingue num castigo eterno. È preciso não recusar a radicalidade da mudança de vida, da metanoia, que é a transformação de uma mentalidade mundana para uma visão espiritual. 

Mãos erguidas para louvar a Deus, pés sempre nas veredas do bem, olhos voltados para as coisas do alto e não para as coisas da terra. Quem deseja a glória da Ressureição e quer escapar do castigo perene, necessita viver este programa estabelecido por Jesus. Todos concordes, unidos na mesma fé, caminhando alegres para a eternidade feliz junto de Deus. 

Com a graça divina é possível a todos viabilizar sua salvação eterna vivendo de acordo com os preciosos ensinamentos de Cristo, hoje recordados.

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

O temor filial de Deus

Há uma relação estreita entre o temor de Deus e o amor a Deus. Ambos são dons do Divino Espírito Santo. Um é o começo do relacionamento interpessoal com a divindade, o outro é a imersão no oceano da dileção divina. O temor conduz a evitar o mal, o amor leva a praticar o bem. Quando se age, porém, somente no interesse próprio, pelo medo de um castigo eterno, a generosa entrega ao Criador se esvai. 

Existe uma diferença entre abominar o que desagrada a Deus por causa dos eventuais castigos pelo desprezo de um dos dez mandamentos e amá-lo porque Ele merece todo o afeto de um coração filial. O cristão procura neste caso se submeter e agradar a Deus não movido pelo receio de uma punição devida a uma má ação, mas porque Ele merece ser amado sobre todas as coisas. 

Então, como bem ensinou São João, “no amor não há medo; o amor perfeito antes expulsa o medo, porque o medo traz consigo uma aflição; e quem tem medo, não é perfeito no amor” (1 Jo 4,18). Deste modo, o cristão teme ofender a Deus não porque Ele pode castigar, mas porque O ama, sendo Ele infinitamente amável. Daí a distinção teológica entre o arrependimento de um pecado por atrição na qual prevalece o temor da penalidade e a contrição perfeita na qual impera a dileção. A contrição perfeita leva o pecador a se arrepender de suas faltas porque Deus é aquele que, unicamente, merece ser amado sobre todas as coisas, sendo El infinitamente amável. Entretanto, o temor reverencial do Ser Supremo produz efeitos magníficos dos quais resulta o progresso no amor, que tende a envolver a vida do cristão.  Com efeito, o temor inspira uma vigilância contínua para fugir de tudo que desagrada ao Todo Poderoso Senhor. 

Induz a se tomar precauções para, nem de longe, ofender Aquele que se ama. Obstáculos são afastados. Todos os liames que podem prender às ilusões terrenas ficam alijados. O mundo e seus efêmeros prazeres é que passam a ser temidos. A sensualidade, o demônio e suas insidias são vencidos. O cristão passa a perceber que o temor servil é próprio dos escravos, enquanto o amor verdadeiro é a porta da autêntica liberdade. No afã de contentar a Deus já não o incomodam os trabalhos, os sacrifícios, mesmo porque o amor tudo supera.  O que se esquece muitas vezes é que há três fontes do temor.   Se este vem de Deus a quem se teme perder é isto uma prova de que é temor louvável e abrirá as portas para o amor.  Se vem da imaginação mal dominada, precisa ser logo banido e a ele não se deve dar atenção alguma. Se vem do demônio, todo cuidado é pouco, pois gerará o desespero. O meio para purificar o temor é a confiança inabalável em Deus, ao qual se deve abandonar inteiramente, entregando-se filialmente nas Suas mãos poderosas. 

 Então o demônio desaparece. Passa a reinar, tão somente, o amor, âncora certa de salvação. Entretanto, entre as consequências saudáveis do temor de Deus está o anseio do cristão de se mortificar, corajosamente se dispondo a impedir tudo que o pudesse afastar de seu Senhor. Foge das ocasiões de pecado não se deixando levar pelas sugestões do espirito do mal. Deste modo, o temor é contrapeso ao relaxamento espiritual e oferece ocasião a atos amorosos daquele que reverencia a Deus porque O quer amar. Eis porque diz a Bíblia: “O temor de Deus é o início da sabedoria”. (Pv 9,10). O cristão vai se tornando cada vez mais dócil, mesmo porque sente ainda mais intensamente a proteção de um Deus que é justo, mas sumamente misericordioso e desejoso de ser amado em plenitude. Vai se operando a passagem do temor para o amor. A alma se abre completamente para a esperança e esta a lança no mar da dileção divina. 

O Espírito Santo, que é o amor eterno entre o Pai e o Filho, toma o governo da vida do cristão que nunca deixa de reverenciar filialmente a Deus, mas faz do amor a atmosfera de sua existência. Ele se torna a cada instante mais unido a seu Criador. Bem escreveu São Paulo: “Aquele que adere a Deis (por amor) se torna um com Ele”. Então já não há lugar para temor algum. Deus começa a reinar numa alma a qual, sob a inspiração do temor filial, atingiu a perfeição do amor.

Duas atitudes de São Pedro

A mesma indagação que Jesus fez um dia a seus discípulos Ele a faz a cada um de nós: “E vós quem dizeis que eu sou?” (Mc 8,29). Trata-se da identidade daquele que veio para redimir a todos. Muitos de seus discípulos estavam enganados O identificando com outras pessoas notáveis como João Batista e Elias. Foi quando São Pedro acertadamente afirmou: “Tu és o Messias?”.

 Caracterizou perfeitamente quem era Jesus, personagem irredutível a todas as comparações e assimilações. São Pedro proclamou Jesus como o esperado das nações e aquele do qual se podia esperar libertação.

 Ele viera a este mundo com esta sublime missão. Aí estava toda riqueza de sua personalidade. Foi brilhante a resposta de São Pedro, ratificada pelo próprio Cristo, uma vez que Ele impôs aos discípulos que “não dissessem tal coisa dele a ninguém”. 
Entretanto, se louvável foi o ato de fé na messianidade do Redentor, faltou a São Pedro reconhecer no mesmo uma característica fundamental. Este Messias, com efeito, era o servo sofredor. Naquele momento São Pedro não foi capaz de cpmpreeder a obra de Deus através do mistério pascal. 

O próprio Cristo detalhou sua caminhada de sofrimentos, sua morte e sua ressurreição. Foi chocante para o Apóstolo escutar o Mestre falando de dores e perseguições advindas dos sumos sacerdotes e escribas. De uma maneira ousada São Pedro vai dizer a Jesus para que Ele mudasse o seu discurso. Através dos tempos, Cristo se apresentaria aos homens a perguntar “quem dizeis que eu sou”? O aclamado do Domingo de Ramos, o taumaturgo que operava prodígios e milagres estupendos, o pregador que atraia multidões ou aquele que foi traído, reduzido a um frangalho humano e ignominiosamente morto pregado numa cruz? Aí está o grande dilema que Jesus apresenta a seus seguidores. 

A resposta é de vital importância porque o batizado necessita compreender que a passagem pela morte, pelo sofrimento, o desapego de si mesmo, não são uma opção facultativa na sua existência cristã. Para se chegar à plenitude da vida é preciso passar pela porta estreita. Jesus pelo seu mistério pascal veio ao cerne da fraqueza humana, da amargura inerente a um exílio terreno para ensinar como mudar tudo isto num ato de amor e de fé, fonte de salvação. Naquele instante São Pedro contemplava a tarefa de Jesus numa visão meramente humana e sua atitude foi taxada de satânica por Jesus.  Sem sua morte não haveria a ressurreição que realizaria a transformação desta morte em vida. Como Jesus tinha o senso das coisas do Pai Ele vivia em função do mistério do amor e responderia pelo seu amor à violência que lhe seria feita pelos seus inimigos. 
 A explosão de sua ternura venceria o mal. Jesus que é a fonte da salvação para os que nele cressem se fez o modelo para todos os seus seguidores. Mostrou então que ser cristão, ter a fé, não é pronunciar palavras ocas, recitar fórmulas vazias.

 É, isto sim, entrar numa existência que manifeste total amor e confiança em Deus, traduzindo em atos concretos a fé e a dileção a Ele, ao Pai e ao Espírito Santo. Mais tarde São Tiago que compreendeu profundamente esta lição afirmaria: “Que aproveita meus irmãos, a um dizer que tem fé, se não tem as obras [...] Mostra-me a tua fé sem as obras, que eu, por meio das minhas obras, mostrar-te-ei a minha fé” (Tg 2,14.18).  

 É esta fé em ato e em verdade que salva porque ela transforma o cristão na imagem de Jesus, o Messias sofredor. Mais tarde São Pedro teria uma visão integral de Jesus e escreveria na sua Primeira Carta: “Bendito seja Deus e Pai de nosso senhor Jesus Cristo que na sua imensa misericórdia, nos regenerou pela ressureição dentro os mortos para uma esperança vital" (1 Pd 1,3). Esta compreensão do mistério Pascal a teria São Paulo que na Carta aos Filipenses declarou: “Jesus, de condição divina, não julgou o ser igual a Deus um bem a que não devesse nunca renunciar, mas despojou-se a si mesmo, tomando a natureza de servo [...]  humilhou-se, fazendo-se obediente até à morte e à morte de cruz. E por isto Deus o exaltou  e lhe deu o nome que está acima de todo o nome” (Fp 2, 5-6.8-9). 

Quando São Pedro tomou Jesus à parte e o repreendeu por falar em dor e morte, ele foi chamado de satanás por Jesus, dado que havia da parte dele total ignorância do mistério pascal. É através de sombras e luzes que se chegará um dia à plenitude da salvação oferecida pelo Messias sofredor. Naquele momento Pedro era satanás, o diabo, porque ele estava a dividir o conhecimento da fé, separando este conhecimento da existência do cristão. 

Este, a exemplo de Cristo, deveria tomar sua cruz e  seguir o Mestre divino para poder também conhecer um dia  a glória da ressurreição.

Lição de humildade e acolhimento


Ao retornar a Cafarnaum, já em casa, Jesus indagou a seus discípulos o que tinham discutido pelo caminho. Eles se calaram porque haviam debatido entre eles quem haveria de ter o primado no novo reino messiânico, quem era o maior entre eles.  O tema então ventilado por estes discípulos de Jesus  era uma fuga, pois não queriam aprofundar o que antes o Mestre lhes havia dito sobre seus sofrimentos antes de entrar na sua glória. 

Eles estavam mais preocupados em avaliar as vantagens que poderiam tirar de sua adesão a Cristo. Como bem observou o teólogo Patrick de Varax, os evangelistas, poderiam ter evitado descer a este detalhe bem humilhante para os apóstolos. O Espírito Santo, porém, quis que esta narrativa fosse feita a fim de atrair a atenção dos seguidores de Cristo através dos tempos para um aspecto importante da vida espiritual. Com efeito, a exemplo daqueles epígonos do Redentor muitos seriam aqueles que encontrariam dificuldade de se entregar inteiramente a Deus, procurando não a glória divina, mas o seu próprio interesse. Outrossim, ou querendo ser mais do que os outros, ou fazendo o  julgamento  daqueles com quem convive, se mostrando assim superior a todos. 

São Tiago alertou: “Onde há rivalidade, se encontra a desordem todas as coisas más” (Tg 3,16). Quando alguém se deixa enclausurar nesta espiral de comparação, rapidamente, abre as portas ao veneno da inveja com todo seu cortejo de malefícios. Tudo fruto da soberba. Jesus, porém, deixou sua lição: “Quem  quiser ser o primeiro, seja o último de todos e o servo de todos” A verdadeira grandeza é não se julgar mais do que os outros. Jesus não pregava uma atitude de humilhação, de subserviência, mas de verdadeira humildade. Esta virtude conduz ao serviço do próximo. Cristo estava a doutrinar o devotamento, a gratuidade, o interesse pelos outros. Daí o seu gesto profético colocando uma criança no meio dos discípulos, salientando justamente brandura, singeleza, acolhimento. Acentuou inclusive que quem acolhesse alguém em seu nome era a Ele que estava acolhendo. Quando, contudo, alguém quer ser o maior, não tem condições de abrigar, nem mesmo uma criança que mais precisa de atenção, de cuidado. No discurso de Jesus o menino era uma parábola viva. 

De fato se deve acolher uma criança não pelos seus méritos, mas simplesmente pela sua necessidade de amparo, de orientação, de sábia e prudente correção. É este acolhimento, porém, que ele quer para todos os irmãos na fé por mais insignificante que ele possa parecer. O Pai enviou seu Filho dileto a este mundo e Jesus encaminha a cada um aqueles que estão a seu derredor. Através do próximo se chega a Jesus e de Jesus se remonta ao Pai. Eis aí a cascata do acolhimento resultado da humildade. Trata-se da vivência cristã que só se consegue através de uma superabundante bondade interior  que esparge benevolência e afabilidade sobre todos e até sobre os ingratos. 

Não se julgando mais importante que os outros o caridoso que contempla Jesus no próximo tende a condoer-se e a ser compreensivo  e multiplica atos de clemência. Deste modo, a benignidade identifica o autêntico cristão. Esse com sua presença e seu comportamento sabe levar a serenidade a todos que dele se aproximam. Tem sempre gestos que fascinam e suscitam amizade, cordialidade. 

Manso e humilde de coração como o Mestre divino, com tato e persuasão, sabe introduzir aqueles que estão em seu derredor na prática das mais valiosas virtudes. Atrai pela cortesia, pela polidez, pela civilidade. Tudo isto traduzindo sua longanimidade, refletindo o divino Redentor por toda parte. Por não se estimar mais perfeito do que os irmãos e irmãs da mesma comunidade, entrega-se à tarefa  de realizar em si mesmo  os valores espirituais e vai crescendo dia a dia na santidade de vida. Comunica então aos outros a alegria que brota da ordem que reina em seu interior, Aplaina para o próximo o caminho da concórdia pacifica e alimenta a unidade caritativa. Quem cultiva o acolhimento e a humildade é também sempre veraz e sabe manter a coerência  entre o que pensa, diz e faz. 

A singeleza de suas palavras e ações estampam aquela serenidade que deve caracterizar quem coloca em prática as lições de Jesus. Por tudo isto a discrição refulge em sua vida. Sabe reconhecer as qualidades que Deus lhe outorgou para cultivá-las a bem próprio e alheio. Torna-se magnânimo-liberal reinando dentro de seu coração a mais profunda humildade e atribui toda boa ação que faz à graça de Deus  e se reconhece  pobre e que sua grandeza vem de Jesus. Vai, assim, gradualmente, chegando à medida da estatura completa de Cristo (Ef.4,13).

Como obter a paz interior

Muitos cristãos, até piedosos, buscam a paz interior e não a encontram. Para se alcançar a verdadeira liberdade oferecida por Cristo há condições basilares. Nem sempre existe um autêntico conceito do que é ser livre. Não há liberdade para se praticar o mal. Quem assim pensasse se julgaria superior ao próprio Deus. Com efeito, o Ser Supremo, fonte de toda a liberdade não pode nunca fazer o mal. Ele somente faz o bem. 

O ser racional, portanto, só é livre quando não perpetra qualquer mal. Não se deve viver ao léu dos próprios desejos, ser escravo de hábitos malignos. Daí surgem os vícios e até a libertinagem. É verdade que, por força do pecado original, possuindo o ser humano uma imperfeição radical, muitas vezes ele não emprega retamente a liberdade. Donde ser necessário não apenas abominar qualquer atitude errada, como também sempre pedir as luzes divinas para agir corretamente em tudo.

 Isto devido à inclinação para o mal inerente ao homem após a expulsão do paraíso de Adão e Eva. São Paulo deste modo se expressou: “Eu sei, efetivamente, que em mim, isto é, na minha carne, não habita o bem. Querer o bem está, sim, ao meu alcance, mas realizá-lo, não. Deste não faço o bem que quero, mas pratico o mal que não quero” (Rm 7,18-20). Mostra, porém, em seguida este Apóstolo que a libertação vem através de Cristo.  Não é fácil vencer o espírito de rebeldia, o orgulho nascente dos desregramentos mais lamentáveis. É preciso frear o amor próprio e escutar a voz das inspirações do Divino Espírito Santo. Nem ininterruptamente, contudo, isto acontece mesmo com pessoas devotas que não se dispõem a vencer o amor de si mesmo, a vaidade, a soberba, a presunção. 

Tudo isto impede frontalmente usufruir a paz interior. Com a ajuda da graça divina os esforços alcançam admirável êxito e os resultados são faustosos. Passa-se a gozar uma paz profunda, longe das agitações ocasionadas pelas paixões. Atinge-se a imperturbabilidade, afastados o mar das iniquidades e os ventos furiosos das tentações. Tudo isto porque são cortados logo no início os primeiros movimentos desregrados.  O Espírito de Deus, que é seguido generosamente, comunica, no meio dos combates interiores, a quietude, a serenidade. Então o cristão mesmo por entre as tribulações inevitáveis a este exílio terreno ou por entre as contradições as mais variadas possíveis fica sossegado, firme na harmonia que contempla dentro de si.

 Confia inteiramente no poder do Deus cuja liberdade imita e este Deus é seu sustentáculo e a fonte desta serenidade interior. O domínio de si mesmo permite então superar todas as dificuldades e tal cristão não se abala nunca e se torna um grande vencedor. Sua vontade se torna estável como um rochedo. Em consequência, sim, podem vir as ondas mais furiosas dos sofrimentos, ou as tempestades violentas das insinuações do maligno, pois fica o fiel inabalável, firme no seu Senhor. É a superação de si mesmo diante do maligno e suas invectivas. Todas as ações são então feitas segundo os parâmetros espirituais e não de acordo com o espírito mundano. 

O eu humano se abre à união com Deus em Cristo, esvaziando-se de si mesmo, mas repleto das luzes celestiais. É o efeito do morrer para si mesmo, para que a paz divina se aposse de todo o seu ser. Aquilo que era na verdade uma diminuição, por ser escravidão dos maus hábitos, desaparece.  Impera a força universal da graça a penetrar definitivamente dentro do coração. O cristão já é não mais manipulado pelo espírito das trevas, mas se assimila a Jesus no qual depara seu único refúgio. Vive num vale de lágrimas, mas degusta dentro de si um pouco da beatitude eterna que terá na outra vida.  

 A própria morte já não envolve em vãos temores, pois está encarregada de realizar em plenitude a quietude que se terá além-túmulo. 

É necessária, entretanto, uma disponibilidade radical à fidelidade a Deus nas menores ações. Uma maleabilidade para que o Espírito Santo possa construir no íntimo de cada um aquela bem-aventurança que não é privilégio apenas dos grandes santos.

A busca da perfeição Cristã

Por entre os afazeres cotidianos, seja qual for o estado de vida de cada batizado, é preciso ele procure seu aprimoramento espiritual. O desejo da própria santificação é um dom maravilhoso ao qual se deve generosamente corresponder. 

Para isto, primeiramente, é necessária a disposição sincera de, em tudo, fazer a vontade de Deus, se desvencilhando daquilo que a contraria. Surge este ideal inclusive da certeza de que nesta sublime trajetória se depara a autêntica felicidade.

 Esta atitude proporciona, realmente, usufruir muito mais a vida impedindo as desgraças que resultam da idolatria dos falsos prazeres mundanos.  Vivendo numa união profunda com Aquele que é três vezes santo, como bem diz o triságio que Ele inspirou ao profeta Isaías, o cristão pode curtir em plenitude a existência nesta terra. Não se prende nunca ao passado, nem se atemoriza com o futuro o qual à Providência divina pertence. 

Ocupa-se do instante presente para realizar com toda aplicação possível o dever de cada hora. Seu intento é tudo fazer para glória de seu Senhor. Deixa-se governar inteiramente pelo Espírito Santo que o induz a bem planejar as tarefas do dia a dia. A total dependência às inspirações divinas leva a uma fidelidade que torna meritórias as mais pequeninas atividades.  Frutuosa é, na verdade, a reta intenção que preside aquilo que cumpre seja feito a cada passo.  

Convivendo initerruptamente com Deus pelas boas ações, nos momentos de oração não depara o cristão dificuldades em conversar com Ele. A simplicidade impera.  Não há lugar para distrações que configurariam um desacato à este sublime Interlocutor. Tal diálogo com a Fonte da sabedoria e da paz resulta num acréscimo de amor a Deus e ao próximo, uma vez que esta dileção ao Criador é difusiva. Eis por que quem assim procede passa longe da inveja, da ira, da crítica ferina aos outros, de todo e qualquer menoscabo com quem se convive. 

É que o verdadeiro cristão vai além da finura de trato, da polidez, pois age sempre pela caridade e pela cordialidade que haure no oceano infinito do amor divino. A exemplo do Doador de tudo almeja o bem das pessoas desinteressadamente sem pensar em qualquer tipo de retribuição. Assim, o autêntico discípulo de Cristo está contente por ser em cada ocasião o que Deus quer que ele seja. Podem surgir desgostos, desânimos interiores e, até, tentações do espírito do mal, mas tal cristão aguarda serenamente que passem as tempestades. 

Não se inquieta e marcha continuamente para frente. Não se desencoraja nunca. Mesmo que venha a cometer deslizes devidos à fraqueza humana, logo se arrepende, se penitencia diante de Deus e, com ardor, prossegue a caminhada. É que deposita em Deus toda sua confiança. Quando se sente fraco, seu amor próprio não o lança no desespero e logo apela pela proteção divina. 

Aparecem as provações físicas ou morais, mas são recordadas as palavras de São Paulo: “De boa vontade me gloriarei de minhas fraquezas para que habite em mim o poder de Cristo” (2 Cor 13,9). Avança então com passos de gigante na via da perfeição.

 Desta maneira o sentimento de sua fragilidade se torna o princípio de sua coragem, pois em Deus encontra toda sua força. Não obstante toda a dificuldade prossegue no esforço de seu contínuo desenvolvimento espiritual. Luta persistente contra todas as potências do mal. Com a graça divina sai vitorioso, dado que é sincero. Sua felicidade se mantem no meio das turbulências e os percalços da existência humana não o abatem. Nada rouba sua imperturbabilidade. 

Percebe então que não vive numa ilusão e redobra seus louvores a Deus no qual depara consolações inefáveis. Trata-se do encontro com a realidade do Ser Divino, presente fora e dentro da alma. 

Uma fé inabalável rasga o véu das aparências e faz degustar já aqui na terra algo das delícias eternas. Compreende-se, desta forma, o que está no livro do Deuteronômio: “Nosso Deus é um fogo que consome” (Dt 14,24). 

Jesus falou claramente: “Eu vim lançar fogo sobre a terra” (Lc 12,49). Ele quer que seu seguidor seja incendiado por esta chama divina. Cumpre, portanto, evitar todo obstáculo à ação divina. O cristão se torna então um clarão que se ilumina e ilumina o mundo. Realiza-se o desejo de Cristo: “Vós sois a luz do mundo”. (Mt 5,14).

Santuário da Divindade

Nunca se reflete demais sobre a advertência que São Paulo fez aos Coríntios: “Não sabeis que sois templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós”? (1 Cor 3,16). Com efeito, o batismo confere a graça deificante que é uma participação na vida divina, introduzindo o cristão na intimidade da existência trinitária. Torna-o capaz de viver com Deus, agindo por seu amor. É uma graça santificante. Perdida pelo pecado grave, ela pode ser recuperada pelo Sacramento da Confissão. Trata-se da presença de Deus não apenas em seu derredor, pois nele o ser racional tem “a vida, o movimento e o ser” (Atos 17,2), mas da presença divina sobrenatural na alma. Esta sublime realidade foi assim expressa por Cristo: “Se alguém me ama, meu Pai o amará, viremos a ele e faremos nele nossa morada” (Jo 14,23). Esta vida divina, que constituirá a essência da felicidade eterna no céu, se comunica desde já àquele que foi batizado.  Este traz em si o Deus vivo, a Suprema realidade. Eis por que São Leão Magno clamava: “Reconhece, ó cristão, a tua dignidade”. A grande questão é cada um se indagar como esta habitação divina, esta presença de Deus em si mesmo, exerce na vida de cada um o papel que ela deve desempenhar. O meio para entrar em contato com o Hóspede divino é a intensificação da vivência das virtudes teologais da fé, da esperança e da caridade e dos dons que elas comunicam. Pela fé o batizado adere à verdade da vida divina que lhe é proporcionada. Pela esperança ele está certo de que pode perseverar em estado de graça. Pela caridade, amor intenso à Trindade Santa, a vida trinitária se torna a própria existência de quem foi batizado. Para se entrar em comunicação com Deus todo formalismo deve ser evitado.  Ele é a simplicidade absoluta. Tanto mais simples é a prece, mais ela agrada ao Ser Supremo. O cristão passa ver Deus em tudo e tudo em Deus. Nada o esmorece e repete com São Paulo: “Se Deus está conosco, quem estará encontra nós? [...] Eu estou certo de que nem a morte nem a vida [...] nem criatura alguma poderá nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus" (Rm 8, 31.38). O cristão então pode dizer a Deus: ”Senhor, eu Vos amo, ou pelos menos, quero vos amar”. Tudo isto não exclui, evidentemente, a manifestação de outros sentimentos da alma para com o seu Senhor. Atos de humildade, de confiança, de abandono nas mãos da Providência do Pai, de adoração e de outras manifestações que o Espírito Santo venha a inspirar. Adquirem-se assim virtudes e cresce o asco para com os vícios. Dá-se um real progresso na vida espiritual e isto é possível para todos. Textos bíblicos servem para alimentar o diálogo com Deus, desde que pausadamente meditados. Esta reflexão gera a solicitude interior, a fidelidade cada vez maior. O cristão passa a viver continuamente na atmosfera da fé e mesmo nos momentos de tribulação conhece uma profunda paz. Nem as tentações, as distrações, as dificuldades interiores e exteriores conseguem então abalar o cristão que assim procede. Prevalece sempre o grande ideal, mesmo porque tal cristão sinceramente sabe que ele não pode nada por si mesmo, mas com Deus realiza proezas (Sl 108,13). É evidente que para se manter nesta ambiência divina é preciso evitar tudo que, ainda de longe, possa conspurcar a alma e distraí-la do centro de suas atenções que é o contato com Deus. O autêntico cristão sabe controlar suas diversões, pois quer estar o máximo possível dialogando com um amigo tão querido como é Deus. Há uma correspondência total às inspirações do Espírito divino. Conta o batizado com a força da Eucaristia, a proteção da Virgem Maria, dos santos, dos anjos a incrementarem sua vida interior e a imolação cotidiana através do cumprimento exato das obrigações. Esta é a penitência e a mortificação que Deus quer. Resulta a coragem para a renúncia a tudo que contraria o Criador.  Não se trata então de procurar a virtude pela virtude, dado que Deus quer que cada um se esvazie de si mesmo, para encher-se do divino.  Deste modo o batizado fica convencido do que disse Jesus: “O reino de Deus está em vós” (Lc 17,21).  Torrente de luz inunda a alma atenta e fiel, a qual se vê imersa no oceano infinito do amor de Deus.

 
Design por 4God